O hino da quarentena da igreja americana chegou aos Estados Unidos a partir da Nigéria, onde a compositora e líder de adoração pentecostal Osinachi Kalu Okoro Egbu, conhecida como Sinach, popularizou pela primeira vez a canção “Way Maker”.

A versão em português, “Caminho no Deserto,” foi gravada por artistas bastante conhecidos como Soraya Moraes.

Desde então, sua bem-sucedida canção alcançou o topo das paradas americanas tanto nas rádios cristãs quanto nas igrejas durante os primeiros meses da pandemia. À medida que as igrejas se uniam aos protestos nos EUA nas últimas semanas, manifestantes cantaram a música em defesa da justiça racial, clamando a Deus como “criador de caminhos, autor de milagres, cumpridor de promessas, luz na escuridão”.

“Way Maker” [“Caminho no Deserto”] ocupa o primeiro lugar na lista das 100 músicas mais ouvidas do Christian Copyright Licensing International (CCLI), com base no uso em igrejas. Em abril, a música também conquistou dois dos 10 lugares mais altos nas músicas da Billboard Hot Christian, quando Michael W. Smith e a banda Leeland lançaram versões populares.

Essa foi a primeira música na história a atingir o top 10 duas vezes ao mesmo tempo. As interpretações de “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] por Mandisa e Passion ficaram em 39 e 40 na mesma lista.

No mês passado, Sinach também se tornou a primeira artista africana a subir ao topo da parada da Billboard Christian Songwriters.

Nascida em Lagos, na Nigéria, a cantora de 47 anos é uma sensação internacional do evangelho há anos, liderando o louvor em uma enorme congregação pentecostal e levando sua música em turnês ao redor do mundo. No ano passado, Sinach se tornou a primeira artista gospel africana a fazer turnê na Índia.

Seu videoclipe original de “Way Maker” [“Caminho no Deserto”], lançado em 2015, foi visualizado mais de 151 milhões de vezes.

Les Moir, gerente e caçador de talentos da Integrity Music no Reino Unido, ouviu a música de Sinach pela primeira vez em 2014, quando recebeu um de seus álbuns durante uma viagem à Nigéria. A Integrity licenciou a “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] de Sinach para aparecer em duas compilações de adoração britânicas, em 2018 e 2019.

Article continues below

Boletins gratuitos

Mais boletins

Mas “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] não decolou entre os evangélicos americanos até que o proeminente cantor cristão Michael W. Smith a lançou como single, em fevereiro, com a cantora de backup de longa data Vanessa Campagna e a líder de louvor Madelyn Berry.

A Integrity Music fez uma parceria formal com Sinach em julho de 2019, segundo Mark Nicholas, vice-presidente de publicação de músicas da empresa. Suas músicas logo apareceram em lançamentos de artistas da Integrity, como Leeland, cujo álbum Better Word trouxe músicas de outros países.

“É óbvio que esta é uma música especial para este momento da história, e o fato de que ela emergiu da África a torna ainda mais atraente e comemorada”, disse Nicholas à CT.

“Way Maker” [“Caminho no Deserto”] foi cantada por cristãos, em protesto, após a morte de George Floyd, inclusive em Milwaukee; Fredericksburg, Virgínia; e Indianápolis, onde foi entoada durante uma vigília de oração interrompida por gás lacrimogêneo da polícia.

A música foi traduzida para 50 idiomas e Sinach escreveu que “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] se tornou “uma música tema cantada em muitos idiomas [para] trazer esperança e fé a muitos em perigo durante a pandemia de COVID-19”.

Em março, Smith lançou uma versão italiana — “Aprirai Una Via” — novamente com Campagna, que é italiana e tem família na Itália, um dos primeiros focos do coronavírus fora da Ásia.

Alguns fãs de Sinach lamentam que Smith tenha gravado sua música, temendo que ele leve o crédito por ela, mas a cantora não está preocupada. Em uma entrevista à CNN África, Sinach disse que fica emocionada quando artistas apresentam seu trabalho ao público.

“A alegria de um compositor é quando você escreve uma música e o mundo inteiro a canta, porque a música realmente não é sobre você”, disse ela. “Se a música vai à sua frente antes mesmo de você aparecer, isso significa que a canção cumpriu seu propósito.”

Article continues below

Na Nigéria, país natal de Sinach, ela é uma superestrela, pois lidera o culto na popular Christ Embassy, em Lagos, uma das maiores igrejas pentecostais do país, conhecida por atrair jovens cristãos com formação universitária. Seu pastor, Chris Oyakhilome, mantém a igreja na vanguarda da música e da tecnologia, de acordo com Nimi Wariboko, professor de ética social da Universidade de Boston que estuda o pentecostalismo na África.

Oyakhilome, cujo ministério também tem congregações em centros urbanos no Reino Unido e em outros locas do mundo, usou suas habilidades de relações públicas e conhecimento técnico para ajudar a impulsionar Sinach à fama internacional. “Ele ajudou Sinach a se divulgar e se tornar essa figura fenomenal”, disse Wariboko. “Ele tem sido fundamental para orientá-la e impulsionar sua carreira.”

A Christ Embassy, porém, acabou se envolvendo em uma polêmica. No mês passado, autoridades britânicas aplicaram sanções à estação de televisão Loveworld, da Christ Embassy, depois que transmitiu um sermão de Oyakhilome em que ele alegou que o COVID-19 foi causado pela tecnologia 5G.

Cerca de 20% dos nigerianos são pentecostais, segundo Wariboko. A popularidade da “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] de Sinach se espalhou pelos ramos trinitários e unitários do pentecostalismo.

De acordo com Leah Payne, professora assistente de estudos teológicos da Universidade George Fox, a redação ambígua de “Way Maker” [“Caminho no Deserto”] torna palatável para os pentecostais trinitários que acreditam no Deus trino, e para os pentecostais unitarianos, que acreditam que só Jesus é Deus.

“Os pentecostais trinitários e unitários têm muitas diferenças culturais e teológicas e nem sempre compartilham as mesmas músicas”, disse Payne, especialista em religião e cultura popular. “Uma razão pela qual ‘Way Maker’ [‘Caminho no Deserto’] pode ter decolado nos dois círculos é que as letras são adaptáveis ao hinário unitário, já que a música não inclui referências explícitas à Trindade”.

Article continues below

Na Nigéria, sua terra natal, a música de Sinach foi a segunda mais ouvida da última década, e outra canção sua (“I Know Who I Am”) está entre as 20 primeiras.

Embora 46% dos nigerianos sejam cristãos, o país é o número 12 na lista de perseguição religiosa da Missão Portas Abertas. Na semana passada, a imprensa nigeriana informou que Emmanuel Bileya, um pastor que serve a Igreja Reformada Cristã na Nigéria (CRCN), e sua esposa, Juliana, foram atacados e mortos enquanto trabalhavam em sua fazenda no estado de Taraba, na Nigéria, deixando oito filhos.

Sinach disse se sentir abençoada quando vê pessoas de todo o mundo gravando suas músicas e adorando com as canções que ela escreveu.

“Elas estão sendo abençoadas, mas eu sou mais abençoada ainda, por ver todo mundo cantando a música”, disse ela à CNN África na semana passada. “Deus pode usar alguém da África, da Nigéria — sim, Nigéria! — para abençoar as pessoas da maneira que ele desejar.”

[ This article is also available in English. See all of our Portuguese (Português) coverage. ]