Estamos agora já há uma semana em guerra aberta contra a Rússia (invasão aconteceu no dia 24 de fevereiro de 2022). Claro, a Rússia está em guerra contra a Ucrânia desde 2014, mas esta é uma fase da guerra sem precedentes. Ainda assim, é incrível a rapidez com que as pessoas se acostumam com as realidades corriqueiras da guerra.

No primeiro dia, a notícia de outras cidades sendo bombardeadas causou grande ansiedade na cidade de Svitlovodsk, onde moro com minha família. Claro, o fato de que a notícia nos acordou antes do amanhecer e foi muito inesperada tornou tudo bem pior. A intenção de causar pânico parecia premeditada.

Agora, já no sétimo dia de conflito, a adrenalina passou. Estamos acostumados ao toque de recolher às 20h e a sentar em um apartamento às escuras de noite. Por conta da exaustão, nós nos pegamos até ignorando algumas das sirenes de ataque aéreo — especialmente aquelas que soam no meio da noite. Também aprendemos que nem toda sirene significa que uma bomba pode cair sobre nossas cabeças.

Mas sempre que vamos para o abrigo antiaéreo, minha família e eu aproveitamos a oportunidade para compartilhar a esperança de Cristo com nossos vizinhos.

Devo admitir que “ministério em um abrigo antibombas” não é um perfil de ministério que algum dia pensei que teria. E, no entanto, já estamos vendo como tem sido frutífero. Nossos vizinhos ouviram mais sobre Cristo, ouviram mais as Escrituras e foram guiados em mais oração na última semana do que provavelmente em toda sua vida, para a maioria deles.

Além da oração do “Pai Nosso”, passei a ler vários Salmos com eles — um livro particularmente adequado para nós, na Ucrânia, pois Davi muitas vezes clama, enquanto é perseguido por seus inimigos.

Uma de nossas vizinhas é o equivalente a uma síndica de condomínio. Na outra noite, no abrigo antiaéreo, ela disse, com lágrimas nos olhos, como estava grata por ter vizinhos como nós. Ela disse que não consegue entender “de onde viemos”. Tivemos de lembrá-la que, se temos algo de diferente, é apenas por causa da esperança que Cristo nos dá.

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Também me perguntaram lá sobre como ler a Bíblia corretamente. O senhor idoso que me me fez essa pergunta já frequentou um curso intensivo sobre o cristocentrismo das Escrituras! Muitas vezes ficamos no abrigo discutindo assuntos de fé muito tempo depois de as sirenes terem silenciado.

Apesar do tempo significativo que passamos no abrigo durante os ataques aéreos, nossa cidade até agora ainda não sofreu qualquer bombardeio real. Entre as razões práticas estão seu tamanho menor (população de 45 mil habitantes) e a falta de alvos estratégicos nas proximidades. Isso, somado ao fato de estarmos em uma encruzilhada no país, fez de Svitlovodsk um destino de refugiados — ou melhor, isso e a providência de Deus.

O bombardeio brutal de alvos civis em Kharkiv, a segunda maior cidade da Ucrânia, levou a outra onda de refugiados nas últimas 24 horas. Anteriormente, os alvos eram principalmente militares. Isso significou que nossa igreja recebeu mais 16 refugiados esta noite, 10 estão em nosso prédio e 6 que ficaram hospedados com uma família de nossa igreja.

Um dos jovens pais das famílias que ficaram em nossa igreja é adepto da espiritualidade hindu e tinha muitas perguntas sobre o cristianismo. Acabei conversando com ele por quase uma hora sobre o que torna o evangelho diferente de outras religiões (ou seja, a graça). Acho que ele passou a ver o cristianismo sob uma nova luz. Trocamos números de celular para manter contato, enquanto ele e sua família se deslocam mais para o oeste nos próximos dias.

Este é o caso da maioria dos refugiados que chegam até aqui. Somos apenas uma pousada, no meio do caminho, para viajantes cansados. Mas esperamos servi-los e ajudá-los a experimentar o amor e a paz de Cristo, mesmo que apenas por algumas horas. Não é nosso trabalho forçá-los à fé — uma abordagem evangelística que raramente produz bons resultados. Em vez disso, desempenharemos qualquer papel que Deus nos conceda: plantar uma semente, regar — ou colher, se a planta estiver pronta. Ele é quem traz o fruto em seu tempo, e podemos descansar nisso.

Todas essas histórias devem nos lembrar de uma verdade vital: que a vitória de Deus é sempre subversiva. Deus sempre toma e usa para o bem o que quer que o Inimigo pretenda fazer para o mal. Isso significa que, quanto mais o Inimigo se enfurece, mais ele se aproxima de sua própria destruição apenas. Deus volta as armas do Inimigo contra o próprio Inimigo, assim como Davi fez com a espada de Golias — e como Cristo supremamente fez com sua morte na cruz.

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Quando o Inimigo pensou que finalmente tinha Jesus bem onde desejava, descobriu-se que ele estava desferindo um golpe mortal em si mesmo. Nosso Senhor venceu usando as armas do Inimigo contra o próprio Inimigo. Nós nos confortamos com isso — especialmente porque a Ucrânia enfrenta um inimigo que se enfurece, tanto no Diabo que adora “roubar, matar e destruir” quanto naqueles pseudorreis que são peões do Diabo.

Acredito que ambos em breve serão derrubados pela vitória maravilhosamente irônica de Deus. Mas, enquanto isso não acontece, contamos com suas orações.

Orem pelos muitos refugiados que esperamos acolher nos próximos dias, principalmente vindos de Kharkiv. Orem para que possamos servi-los bem e lhes mostremos o amor de Cristo, e para que Deus abra as portas. Orem para que Deus cuide de todos eles.

Orem por força e sabedoria em meio a tantas necessidades. Todos nós estamos lutando o tempo todo e não dormimos o suficiente. Por favor, orem pela equipe de ministério da nossa igreja. Orem para que eu possa usar cada convite para entrevistas, artigos, podcasts e muito mais para glorificar aquele que é nossa rocha e refúgio.

Orem para que meus amigos mencionados acima venham a conhecer a beleza do evangelho em suas vidas.

Orem para que a vitória subversiva de Deus venha rapidamente contra o tirano que aterroriza nosso país. Orem para que Deus seja glorificado ao transformar a arrogância humana em humildade.

Benjamin Morrison é pastor da Calvary Chapel Svitlovodsk, na Ucrânia, e está levantando ajuda para refugiados. Ele é um missionário americano veterano de 20 anos, e ele e sua esposa ucraniana têm dois filhos.

Traduzido por Mariana Albuquerque.

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