A essa altura, dois anos após o início do conflito, muitos já se esqueceram da Ucrânia. Como geralmente acontece depois de uma crise global, com o passar do tempo acabamos ficando indiferentes, irritados ou voltando a atenção para outras notícias. Evidentemente surgiram outros conflitos internacionais mais recentes, que também merecem nossa atenção e nossas orações.

No início de 2022, a Ucrânia começou a receber ampla atenção mundial, durante a invasão pela Rússia; porém, grande parte da ajuda inicial diminuiu desde então. Não apenas o apoio financeiro, material e moral de forma geral foi bastante reduzido, mas, em certos círculos, a Ucrânia se tornou um peão político para alguns — especialmente com a rápida aproximação das eleições presidenciais dos EUA.

Em 2014, quando o conflito no leste da Ucrânia começou, há uma década, a comunidade global sabia que a Rússia provavelmente estava se preparando para ações mais agressivas. Mas nada poderia ter me preparado para a manhã de 24 de fevereiro de 2022, quando fiquei profundamente abalado com as imagens de explosões e de veículos blindados que começaram a encher os noticiários e a Internet.

Sou pastor em Lynchburg, na Virgínia, mas nasci na Ucrânia e tenho muitos amigos e parentes que ainda moram lá. Quando o choque inicial diminuiu e consegui me comunicar com meus entes queridos, algo foi despertado em mim. No segundo mês da invasão russa, quando milhões de pessoas estavam lutando para deixar a Ucrânia, viajei para lá para incentivar e servir as pessoas afetadas pelo conflito.

Visitei a Ucrânia por quatro vezes, nos últimos dois anos, e testemunhei em primeira mão a devastação contínua provocada pela guerra. Em minhas viagens mais recentes, fiquei com o coração partido ao encontrar irmãos e irmãs [das igrejas ucranianas] que se sentiam negligenciados ou esquecidos pela igreja global.

Nos dias de hoje, com nosso limitado span de atenção e com tantas crises globais em andamento, é difícil fazer nosso coração se concentrar em histórias individuais de devastação. No entanto, acredito ser vital para nós, como crentes, que nos lembremos constantemente do sofrimento de nossos irmãos em Cristo — e cultivemos essa lembrança como uma prática habitual em nossa vida agitada e cheia de distrações.

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Sempre que penso na Ucrânia, não consigo tirar da mente as palavras de Hebreus 13.3. O autor implora aos seguidores de Jesus Cristo que “lembrem-se dos que estão na prisão, como se aprisionados com eles; dos que estão sendo maltratados, como se fossem vocês mesmos que o estivessem sofrendo no corpo” (grifo acrescentado).

Como cidadãos do reino de Deus, somos chamados a dar atenção especial às necessidades dos mais vulneráveis entre nós (Provérbios 31.8-9, 1João 3.17-18, Tiago 1.27). Estamos conectados em um só corpo, o corpo de Cristo (1Coríntios 12.12), e nossas igrejas locais são expressões em escala menor de uma igreja global projetada para funcionar em união. Assim como jamais ignoraríamos uma parte de nosso próprio corpo, se ela estivesse sofrendo, o corpo de Cristo — a igreja — funciona de maneira semelhante. Como Paulo diz: “Se um membro sofre, todos os outros sofrem com ele” (1Coríntios 12. 26). Negligenciar ou esquecer um membro que está sofrendo pode causar danos ao corpo inteiro.

Somos chamados a compartilhar os fardos uns dos outros, permitindo que nos sintamos pressionados por sua dor. Fazer isso reflete o caráter de Jesus, que entrou no tempo e no espaço para se juntar a nós, em nossas aflições mortais. As Escrituras nos asseguram que nosso Salvador é “um homem de dores e experimentado no sofrimento” (Isaías 53.3), que conheceu a tristeza e sabe o que é padecer (Mateus 26.38, Hebreus 5.7). E, por causa disso, ele sabe como ajudar aqueles que estão sofrendo (Hebreus. 2.18). Quanto mais compartilharmos com os que sofrem as nossas orações sinceras, a nossa presença e os nossos recursos, mais nos comportaremos como Jesus.

Mais do que isso, o fato de continuarmos a nos lembrar do sofrimento dos outros nos prepara para possíveis sofrimentos nossos no futuro. Ninguém quer sofrer, mas é garantido que passaremos por isso em algum momento da vida, pois as Escrituras garantem que “aqui no mundo vocês terão aflições” (João 16.33). Não há pessoa, comunidade ou nação que seja imune a conflitos e tragédias. Nossos colegas cristãos que estão em lugares como a Ucrânia podem nos ensinar sobre resiliência e coragem — e sobre o poder do evangelho em meio à calamidade e ao sofrimento. Precisamos deles tanto quanto eles precisam de nós!

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Por fim, mas igualmente importante, podemos usar nossas vozes e compartilhar nossos recursos. Temos a tendência de ser grandes embaixadores das coisas que amamos e, instintivamente, queremos compartilhá-las com outras pessoas. Muitas vezes, mal posso esperar para contar às pessoas sobre algum novo restaurante ou filme de que gostei. Se realmente amamos nossos irmãos e irmãs que sofrem, por que não contaríamos aos outros sobre a situação difícil que eles enfrentam?

Isso inclui dar visibilidade a vozes e histórias dos necessitados, bem como reunir e compartilhar com eles os nossos recursos — entre os quais estão parcerias com organizações locais para suprir necessidades vitais, como alimento, água e suprimentos médicos. Deus pode usar os diferentes recursos que temos em nossas vidas, bem como nossas esferas de influência, para atender a necessidades específicas que eles têm. Por exemplo, criei a The Renewal Initiative para conectar pessoas e recursos com indivíduos vulneráveis espalhados pelo mundo todo; nesta primavera, estamos fazendo uma parceria com um grupo de profissionais de saúde mental, para que ofereçam encorajamento e apoio aos trabalhadores humanitários na Ucrânia.

Uma das maneiras de cumprirmos a “lei de Cristo” é carregando os fardos uns dos outros (Gálatas 6.2), mas não podemos compartilhar esse fardo sozinhos — nem devemos. Nenhum indivíduo isoladamente poderia atender a todas as necessidades daqueles que estão sofrendo. Nenhuma organização isoladamente tem todos os recursos necessários para cuidar dos necessitados. Mas, quando indivíduos e organizações se unem, o fardo fica mais leve e muitas necessidades podem ser atendidas. Para sermos sustentáveis, precisamos de outras pessoas que nos ajudem a suportar o fardo de continuar a lembrar daqueles que estão sofrendo.

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Talvez, porém, nossa arma mais poderosa seja levar esse fardo perante o Senhor em oração. Nunca subestime o poder da oração nem o modo que o Espírito Santo pode usar nossas orações específicas para abençoar e encorajar os necessitados. Nem todos podem ir e servir na Ucrânia, mas todos nós podemos abrir espaço em nossa dinâmica espiritual para orar por nossos irmãos e nossas irmãs da Ucrânia e de outras comunidades vulneráveis em todo o mundo.

Gostaria que você pudesse ver a expressão no rosto das pessoas da Ucrânia, quando digo a elas que meus amigos no Ocidente estão orando por elas. A resposta delas geralmente é: “Muito obrigado! Por favor, agradeça a todos por orarem por nós e peça a eles que não parem de orar”.

Em uma de minhas primeiras viagens de volta à Ucrânia, conheci um pastor que ficou para servir sua igreja durante a invasão inicial da Rússia, mesmo depois de mais de 60% de sua congregação ter deixado a área. Centenas de refugiados vieram de outras partes da Ucrânia e precisavam de cuidados especiais. E, no entanto, uma das coisas que ele disse, e que sempre levarei comigo, é que ele não se sentiu sozinho em seus esforços, por causa das orações contínuas dos santos em todo o mundo.

No segundo aniversário da invasão em grande escala promovida pela Rússia, continuemos a nos lembrar de nossos irmãos e de nossas irmãs da Ucrânia. Esse ato de obediência os abençoará e enriquecerá nossa caminhada espiritual. Pois, ao nos aproximarmos do sofrimento dos outros, nosso coração pode se expandir, de modo a refletir melhor o amor de Deus pelo mundo como um todo. Jesus ainda está agindo em meio ao sofrimento de homens, mulheres e crianças na Ucrânia, e podemos participar dessa obra quando continuamos a nos lembrar deles.

Andrew Moroz é um pastor americano de ascendência ucraniana, fundador da The Renewal Initiative.

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