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O acesso das crianças à pornografia é um problema. Será que criar leis é a solução?

Enquanto alguns ativistas cristãos lutam para haver verificação de idade em sites pornográficos, outros dizem que o monitoramento é responsabilidade dos pais.
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O acesso das crianças à pornografia é um problema. Será que criar leis é a solução?
Image: Edits by CT / Source Image: Getty Images

Quando os pais perguntam a Chris McKenna em que idade devem dar um smartphone aos filhos, ele tem uma resposta padrão: “A idade em que você quiser que eles vejam pornografia”.

O ex-pastor de jovens fundou, em 2015, a Protect Young Eyes — uma organização sem fins lucrativos que ensina segurança tecnológica a escolas, empresas, igrejas e pais —, devido à sua preocupação com o desaparecimento das barreiras entre a pornografia e os jovens.

“Eu estava observando que, pela primeira vez na história da humanidade, estávamos colocando a Internet no bolso das crianças”, disse ele, “e isso me aterrorizou.”

Nos anos seguintes, a idade média em que as crianças eram expostas à pornografia pela primeira vez tendeu a diminuir. Os pesquisadores estimaram, em 2021, que ela girava em torno dos 11 anos.

Como os dados continuam a mostrar os danos causados pela exposição à pornografia, especialmente em crianças, tem crescido o apoio em favor de limites legais mais rígidos para conteúdos pornográficos. A descrição de função de McKenna, como chefe da Protect Young Eyes, também cresceu — agora inclui a militância política.

Em 2019, McKenna testemunhou perante o Comitê Judiciário do Senado dos EUA, recomendando que os legisladores tornassem uma obrigação das empresas de tecnologia a facilitação do uso de filtros de segurança e do controle parental nos dispositivos que produzem.

Este ano, McKenna consultou profissionais especializados na criação de textos de lei e testemunhou perante legisladores em vários estados, em defesa de novas leis que imponham a verificação de idade, que exijam que os sites pornográficos verifiquem se seus usuários têm 18 anos ou mais. Sete estados — Texas, Louisiana, Utah, Mississippi, Carolina do Norte, Arkansas e Virgínia — aprovaram leis com verificação de idade este ano.

No Texas, McKenna ajudou especialistas na criação de textos de lei a redigirem o que se tornou o Projeto de Lei 1181 da Assembleia estadual, que o governador Greg Abbott transformou em lei no verão. A medida foi imediatamente contestada com base na Primeira Emenda, e um juiz do tribunal distrital a revogou, invocando questões relacionadas à liberdade de expressão e à privacidade. O gabinete do procurador-geral do Texas, Ken Paxton, está apelando dessa decisão.

Angela Paxton, esposa de Paxton e senadora estadual do Texas, foi a propositora original do Projeto de Lei 1181. Os Paxtons são membros da Prestonwood Baptist Church, uma megaigreja localizada em Plano [cidade do Texas]. Um pastor da Prestonwood, Mike Buster, trabalhou com Paxton e Chris McKenna na elaboração e na defesa desse projeto de lei na Assembleia estadual do Texas.

O mecanismo adotado por cada lei para a verificação de idade difere de um estado para outro. Na Louisiana, os sites pornográficos redirecionam automaticamente os visitantes para um site estatal, onde eles devem carregar suas informações de identificação. A maioria dos outros estados exige que os próprios sites pornográficos coletem e verifiquem as informações de identificação dos usuários.

Mas não há dúvida de que as leis restringiram o acesso à pornografia on-line, de forma direta ou indireta.

O Pornhub, o maior site de pornografia do país, agora bloqueia o acesso a seu site para usuários de pelo menos quatro estados — Utah, Arkansas, Virgínia e Mississippi —, em um esforço para não ter que cumprir as exigências de coleta de dados para identificação do usuário. Quatro meses depois que a lei da Louisiana entrou em vigor, em janeiro passado, um porta-voz do Pornhub disse à CNN que acessos ao seu site provenientes de endereços IP da Louisiana haviam diminuído em 80%.

Ministérios cristãos como o Focus on the Family e o Covenant Eyes têm lutado há décadas por limites mais rígidos para a obscenidade no entretenimento e nas leis, muitas vezes sem nenhum apoio secular. O National Center on Sexual Exploitation [Centro Nacional sobre Exploração Sexual], uma organização não sectária com raízes cristãs, semelhante a anteriormente conhecida Morality in Media [Moralidade na Mídia], também se manifestou a favor de regulamentações.

Às vezes caricaturados como puritanos ou repressores, os cristãos envolvidos nessa luta contra a pornografia fundamentam sua militância no ensinamento bíblico de que o sexo é sagrado e de que cada pessoa humana, bem como seu corpo, devem ser tratados com respeito e dignidade. (As reações ao uso do Covenant Eyes pelo novo presidente da Câmara, Mike Johnson, destacam a diferença entre a forma como os evangélicos e a cultura secular abordam o uso da pornografia).

Mas McKenna e outros militantes cristãos antipornografia argumentam que criar ou assistir à pornografia não é pecado apenas para os cristãos. Eles acreditam que é algo nocivo para todo mundo, como todos os outros pecados.

As pesquisas continuam a confirmar isso, fato que levou a posição contra a pornografia a se aproximar da agenda predominante. Até agora, 17 estados aprovaram resoluções que consideram a pornografia uma “crise de saúde pública”.

Ainda assim, McKenna espera que mais cristãos se envolvam com a questão. “Acredito que os líderes de igreja deveriam comparecer em massa para apoiar a legislação que batalha para criar espaços digitais mais seguros para as crianças”, disse ele. “As famílias precisam de mais ajuda.”

Alguns cristãos e conservadores, no entanto, não apoiam essa abordagem legislativa. A XXXChurch, nome provocativo de um ministério que ajuda pessoas que lutam contra o vício em pornografia, diz em seu site que “culpar a indústria pornográfica por nossos problemas ou confiar em leis para nos proteger não funciona".

Outros se preocupam com a questão de as leis de verificação de idade serem uma invasão de privacidade ou com o fato de que a responsabilidade de proteger as crianças da pornografia seja dos pais, não do governo.

Steve Demetriou tem dois filhos pequenos e um novo bebê a caminho. Ele também é deputado estadual em Ohio, onde recentemente apresentou um projeto de lei em prol da verificação de idade. Demetriou é membro da Igreja Ortodoxa Grega e disse que sua fé, bem como o incentivo de um assessor legislativo católico, motivaram-no a apresentar esse projeto de lei.

“Já é ilegal em Ohio distribuir pornografia para crianças”, disse Demetriou. “Estamos apenas trazendo isso para a era digital e criando barreiras on-line de bom senso.”

Demetriou diz que é sensível às preocupações da Primeira Emenda em relação ao projeto de lei de Ohio, que inclui penalidades criminais pelo uso, em vídeos pornográficos, de imagens de pessoas reais, manipuladas por IA, sem o conhecimento ou sem o consentimento do indivíduo. Ele disse que planeja perguntar à Comissão de Controle de Cassinos de Ohio como eles verificam a idade de seus clientes sem violar as leis de liberdade de expressão ou que regulam a privacidade.

“Precisamos fazer com que seja tão difícil para crianças (...) assistirem à pornografia on-line quanto é para menores de idade fazerem apostas esportivas ou comprarem cigarros”, disse Demetriou.

Danny Huerta é conselheiro profissional licenciado e vice-presidente na área de criação de filhos e jovens da Focus on the Family, onde supervisiona a Plugged In, uma publicação que traz avaliações e classificações de mídia feitas pela organização conservadora. Ele disse que as leis de verificação de idade são um “bom começo” no esforço para proteger as crianças da pornografia on-line.

“Eu de fato acho que isso pode ajudar um pouco”, disse Huerta. “Ainda não substitui o fato de os pais precisarem colocar filtros [...] e serem muito intencionais em suas conversas com as crianças.”

Huerta, que também aconselha famílias em seu consultório particular há 20 anos, disse que tem visto um aumento alarmante na última década no número de crianças que assistem à pornografia, bem como um aumento preocupante no grau de perversões ligadas à pornografia, o que inclui violência sexual, atividade sexual com animais e até mesmo atração sexual por sangue.

Huerta frequentemente recomenda que os pais instalem softwares de bloqueio de pornografia nos dispositivos de seus filhos, mesmo que isso possa tornar o processamento do sistema mais lento. Produtos como o Net Nanny, o FamilyShield da OpenDNS, o BrowseControl e o Net Angel oferecem o bloqueio de determinados sites identificados como portadores de “conteúdo adulto”. Huerta está particularmente esperançoso com o Canopy, um software de filtragem que usa IA para verificar, em tempo real, se uma imagem é pornográfica, e poder bloqueá-la instantaneamente.

Ainda assim, Huerta disse que os filtros e até mesmo as leis de verificação de idade não resolverão tudo. “Digamos que haja um irmão de 18 ou 19 anos que esteja acessando [pornografia]. As crianças ainda podem se deparar com isso acidentalmente”, disse ele.

É por isso que Huerta está focado principalmente em ajudar os pais a discipularem seus filhos para que escolham, por iniciativa própria, desviar o olhar das imagens pornográficas. Para isso, a Focus on the Family criou um modelo de “contrato telefônico” que pais e filhos podem preencher juntos, quando negociam limites e consequências para o uso de tecnologia.

McKenna, da Protect Young Eyes, disse que a responsabilidade de proteger as crianças da pornografia não pode e não deve recair somente sobre os pais. Ele se preocupa particularmente com as crianças cujos pais não têm tempo, conhecimento ou motivação para monitorar o uso que seus filhos fazem da tecnologia.

Em vez disso, McKenna acredita que as empresas de tecnologia devam ter a obrigação de tornar seus dispositivos o mais seguro possível para as crianças. No Texas, ele ajudou a elaborar uma legislação complementar à lei de verificação de idade, voltada para criadores de dispositivos como a Apple e o Google, a qual teria definido requisitos para configurações padrão mais rígidas e controles parentais mais simples.

“Atualmente, são necessárias mais de 30 passos para configurar adequadamente o controle parental em um iPhone”, disse McKenna a legisladores federais, em 2019. Ele pediu aos legisladores do Texas que forcem os fabricantes de dispositivos a simplificar esse processo e a tornar o mais rigorosas possíveis as configurações padrão de qualquer dispositivo que possa ser usado por crianças. Isso poderia incluir o bloqueio do acesso à Internet ou a determinados aplicativos durante o horário escolar ou durante a noite.

Os legisladores do Texas não conseguiram aprovar esse projeto de lei a tempo este ano, disse McKenna, mas ele acredita que concentrar os esforços em políticas voltadas para o “nível dos dispositivos” é o melhor caminho a seguir.

“Criamos padrões de vida e de aprendizado que exigem que as crianças estejam on-line”, disse McKenna. “Cada dispositivo sabe quando uma criança o está usando. [...] O padrão desse dispositivo não deveria ser a versão mais segura possível? Não é assim que fazemos com tudo o mais que as crianças usam — berços, assentos de carro, bicicletas, playgrounds?”

Alguns militantes dizem que são a favor das leis de filtragem de dispositivos, pois as leis de verificação de idade correm o risco de serem revogadas por motivos constitucionais, como no Texas.

No entanto, McKenna, da Protect Young Eyes, tem esperança de que a lei de verificação de idade do Texas sobreviva ao escrutínio judicial e acabe se mostrando proveitosa — e de que outros estados considerem medidas semelhantes.

“Ela tem que funcionar em algum nível”, disse ele.

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[ This article is also available in English. See all of our Portuguese (Português) coverage. ]

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