A maneira de resolver o conflito entre Israel e Hamas é muito simples, segundo explicou recentemente o jornalista Matt Yglesias. Poderíamos resolver a questão com apenas cinco passos:

“Meu plano para resolver a crise:
1. Uma pausa humanitária nos ataques
2. A libertação dos reféns
3. Palestinos e israelenses desenvolvem preferências diferentes e mais razoáveis do que as que eles realmente têm
4. A solução de dois Estados
5. Os Estados árabes normalizam suas relações com Israel”

É um excelente plano, não é mesmo? Eu gostei muito! Só que — bem, esse terceiro passo parece um pouco complicado.

E como Yglesias escreveu detalhadamente no Substack, o ponto é justamente esse. Obviamente, esse plano de cinco passos é uma piada, uma ironia. Mas ele toca em um ponto que muitos dos comentários sobre esse assunto parecem não perceber — o que acontece nos EUA, com toda certeza, e muito provavelmente em outros lugares ao redor do mundo. E o ponto em questão é o fato de que os líderes políticos israelenses (sem falar dos assassinos do Hamas) não ignoram o que nós, observadores externos, acreditamos ser o caminho certo e prudente a seguir.

“Eles simplesmente discordam”, observa Yglesias, e é improvável que parem de discordar, assim como é improvável que nós tenhamos o poder de mudar muito a forma como eles pensam, se é que temos qualquer influência nesse sentido. Por “nós” eu me refiro em parte ao governo dos EUA, que, apesar de todo o seu poder, é objetivamente limitado em sua capacidade de mudar o comportamento de combatentes que acreditam, com razão, que estão envolvidos em uma luta existencial. Mas também me refiro especificamente a você e a mim — bem como a nossos irmãos cristãos em todo o mundo.

Nós não podemos solucionar essa crise, por mais fiéis, factuais e fervorosos que sejamos.

Penso que vale a pena dizer isso por dois motivos. Um deles é o nosso hábito moderno de “conscientização”, como quando, por exemplo, eu posto este artigo no Facebook porque quero aumentar a conscientização.

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Assim como acontece com muitas questões de grande importância, a realidade é que a maioria de nós pode fazer muito pouco para realizar mudanças significativas. Às vezes, podemos doar dinheiro para uma causa relevante. Sempre podemos orar (1Tessalonicenses 5.17) e tomar cuidado para não pecar no coração ou com palavras, quando reagirmos às notícias (Mateus 5.21-30). Mas a maioria de nós não é um cientista que pode encontrar a cura para o câncer, nem um político que pode propor uma nova lei de imigração americana, nem mesmo um general que possa decidir sobre quem as bombas cairão. Nossos deveres para com Deus e para com o próximo geralmente são mais iminentes e mundanos, e se Deus responde às nossas orações, é muito mais por obra dele mesmo do que nossa.

Ainda assim, nós nos vemos diante de uma quantidade enorme de informação sobre problemas que estão próximos e distantes de nós. Esse é o ruído de fundo de todas as conversas digitais. Sentimos a necessidade de reagir —, mas como? Que bem tangível podemos fazer? Muitas vezes, como pessoas finitas em um mundo caído, a resposta frustrante é: nenhum, absolutamente nenhum. Muitas vezes, a única ação visível que podemos ter é a que chamamos de “conscientização”, e muitas vezes isso se resume a promover uma corrida por alguma causa ou fazer algumas postagens nas mídias sociais.

A conscientização não é algo ruim, mas fazer burburinho não significa mudar. A conscientização — e a opinião que a acompanha — não é, por si só, uma solução. Ter ideias e informações em nossa cabeça não resolverá uma crise que está a meio mundo de distância e totalmente fora de nossa esfera de influência. “Quem de vocês, por mais que se preocupe, pode acrescentar uma hora que seja à sua vida” — ou pode subtrair uma hora que seja de algum conflito distante? (Mateus 6.27).

E não só isso, mas esse tipo de preocupação também pode desviar nossa atenção e energia de outros usos melhores. O que é melhor: eu aumentar a conscientização sobre o câncer ou eu fazer um jantar para um membro da minha igreja que está fazendo quimioterapia? Isso não é difícil de responder.

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O segundo motivo é que, como cristãos, temos, como de fato é apropriado termos, a fidelidade e seus efeitos em alta conta. Pela fé, os filhos de Deus “praticaram a justiça”, “fecharam a boca de leões” e “pela ressurreição, tiveram de volta os seus mortos” (Hebreus 11). Como Paulo escreveu aos coríntios, podemos ser “cooperadores de Deus”, e cooperadores cuja fé repousa “no poder de Deus” (1Coríntios 3.9, 2.5). A “oração de um justo é poderosa e eficaz”, ensinou Tiago, lembrando-nos da história de Elias — que “era humano como nós” —, mas cuja oração sincera levou tanto à fome quanto à fartura (5.16-18).

Contudo, a fé não é algo mágico, nem é garantia de um final feliz deste lado da eternidade. Ela nem sempre consegue nos proteger ou afastar os outros do mal.

Os heróis da fé, em Hebreus 11, não puderam contar com o triunfo sobre a adversidade em qualquer sentido imediato que fosse: Alguns “enfrentaram zombaria e açoites, outros ainda foram acorrentados e colocados na prisão, apedrejados, serrados ao meio, postos à prova, mortos ao fio da espada. Andaram errantes, vestidos de pele de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos e maltratados.” (v. 36-38). Eles “foram torturados e recusaram ser libertados, para poderem alcançar uma ressurreição superior” — e, embora tenham vindo a alcançá-la, ainda assim foram torturados (v. 35).

A fidelidade cristã também não pode ter efeito onde ela não existe. Um ensaio recente sobre o conflito entre Israel e Hamas, publicado na Red Letter Christians, termina com uma exortação de um pacificador cristão palestino, o qual, “quando perguntado sobre o que ele acha que mais contribuirá para acabar com essa violência”, disse: “Quando seguirmos o Jesus de quem falamos, essa crise acabará”.

A parte de mim que está convencida de que Jesus chama seus seguidores para a pacificação e a não violência quer concordar, mas o realista que habita em mim diz que isso simplesmente não é verdade.

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Sim, os cristãos devem seguir a Jesus, seja na guerra, seja em qualquer outra circunstância. Mas a a fidelidade cristã não acabará com essa crise, em grande parte porque as pessoas que estão em guerra aqui, em sua esmagadora maioria, não são cristãs. Há alguns cristãos judeus messiânicos nas Forças de Defesa de Israel e entre os civis israelenses, e há alguns crentes árabes que fazem parte da população civil de Gaza, onde eles e suas igrejas não foram poupados dos ataques. Mas, de modo geral — especialmente nos escalões superiores, onde as decisões estratégicas são tomadas, e por completo no Hamas — esse é um conflito entre combatentes que não são cristãos.

Não podemos esperar que eles sigam a Jesus, se nunca fizeram dele seu Senhor. Não devemos esperar que eles valorizem uma perspectiva cristã sobre o que fazer (1Coríntios 2.14, 5.12-13a). Essa é a versão cristã do terceiro passo de Yglesias — ou seja, uma piada, tanto quanto sua versão secular.

Isso não quer dizer que nossa fé não seja importante aqui. Está além do nosso poder acabar com essa crise, mas não está além do poder de Deus.

Costumamos dizer que a famosa oração de Elias trouxe fartura, e de certa forma de fato trouxe; mas quando “o céu enviou chuva, e a terra produziu os seus frutos” (Tiago 5.18), isso não aconteceu pelas mãos de Elias. Foi obra de Deus. E podemos ser “cooperadores de Deus” cuja fé repousa “no poder de Deus”, mas ainda assim a obra é de Deus e o poder é de Deus. Quando os filhos de Deus “praticaram a justiça”, “fecharam a boca de leões” e “pela ressurreição, tiveram de volta os seus mortos” (Hebreus 11), não foram realmente eles que fizeram tudo isso, mas sim Deus, que agiu por meio deles.

Para Deus, como seria acabar com essa crise? Eu não sei. As dificuldades práticas parecem insuperáveis para mim. De qualquer forma, não tenho boas ideias e não tenho poder para colocá-las em prática. Só posso por a minha “esperança no Senhor, desde agora e para sempre” (Salmos 131.3), deixar de me preocupar com “coisas difíceis demais para mim” (131.1, NASB) e orar pela paz. Talvez Deus pudesse prosseguir com a Segunda Vinda. Ora, “não seria este um bom momento para ele voltar?

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Bonnie Kristian é diretora editorial da Christianity Today para livros e ideias.

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